Jorge Folena: Responsabilização da Lava Jato

Manifestação no MPF de Curitiba, após vazamento pelo The Intercept de conversas dos procuradores  (set/2019)- Fotos: Gibran Mendes/Fotos Públicas


Jorge Folena*

O atual Procurador-Geral da República denunciou que a Lava Jato de Curitiba tem em seus arquivos secretos mais informação do que toda a sua Procuradoria e que mais de 30 mil brasileiros foram investigados, sem que se saiba como ocorreram essas apurações, que bisbilhotaram a vida das pessoas e ameaçam a sua privacidade e intimidade, que têm proteção de inviolabilidade constitucional. A revelação do Procurador-Geral da República deixou evidente o que muitos já sabiam: a Operação Lava Jato é um órgão paralelo ao Estado, que atua por conta própria e sem prestar nenhuma satisfação aos seus superiores hierárquicos no Brasil.

A Constituição afirma que “o Ministério Público da União tem por chefe o Procurador-Geral da República”; e diz ainda que “são princípios institucionais do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional”. Ou seja, não existem dois Ministérios Públicos, uma vez que se trata de instituição única e indivisível.

Porém, os membros da Lava Jato querem transmitir à população a ideia de que são uma unidade autônoma e “limpa”, isenta das mazelas da corrupção. De certa forma, utilizam isto para intimidar o seu chefe, com o apoio conferido pelos meios de comunicação social em busca de anunciantes.

A independência funcional dos procuradores e/ou promotores de Justiça não retira deles a subordinação hierárquica nem o dever de prestar contas de suas atividades funcionais. É inaceitável que unidades da instituição tenham arquivos secretos, o que é inadmissível numa República democrática, que exige, acima de tudo, igualdade e transparência.

Nos tempos do regime ditatorial de 1964-1985, era comum os órgãos de repressão do Estado terem arquivos clandestinos, utilizados para extorquir e chantagear indivíduos, muitos dos quais desapareceram e foram assassinados por aparelhos estatais, como confirmado pela Comissão Nacional da Verdade. A existência de arquivos secretos, em regimes de exceção, somente serviu para favorecer algumas pessoas que ocupavam cargos públicos repressivos e se beneficiaram e enriqueceram às custas do Estado.

Há pouco tempo, a Lava Jato tentou constituir, para si e seus interesses políticos particulares, um fundo privado de mais de R$ 2 bilhões de reais, formado com dinheiro público, decorrente de um absurdo acordo de leniência firmado pela Petrobras com acionistas minoritários americanos – o que foi impedido pela anterior titular da Procuradora-Geral da República e pelo Supremo Tribunal Federal.

Neste ponto, saliente-se que a Constituição veda aos membros do Ministério Público receberem, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas. Além disso, procuradores que proferiram palestras e participaram de eventos realizados com patrocínio de bancos e empresas não agiram de conformidade com a ética que se espera dos integrantes da instituição, que, por sua vez, apresentam-se com um moralismo exagerado contra os demais cidadãos perseguidos pela operação.

A Constituição de 1988 veio para abolir toda forma de segredo e impedir que órgãos estatais atuem de modo patrimonial, em benefício de seus titulares. Por isso, é inadmissível que existam registros ou bancos de dados secretos, mesmo que empregados para investigação criminal, uma vez que muitas informações pessoais (da vida privada ou intimidade) podem vir a ser utilizadas para intimidação ou chantagem.

Em razão disso, o Brasil não tolera mais a perseguição judicial e policial, promovida pela Operação Lava Jato contra os que lutam e defendem a soberania, o desenvolvimento social e um país mais justo e solidário para todos. Prisões preventivas, na maioria das vezes desnecessárias e com total desrespeito ao princípio constitucional da presunção de inocência, continuam sendo utilizadas pela Lava Jato como forma de espetáculo público de execração da personalidade de brasileiros e instrumento de tortura psicológica para obter indevidas delações.

O Estado de exceção e o fascismo em curso no Brasil são consequências das medidas autoritárias e abusivas praticadas por integrantes da Lava Jato, como manifestaram os ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal.

Chegou a hora de darmos um basta ao autoritarismo promovido pela Operação Lava Jato, que nos lançou no caos político e econômico em que nos encontramos hoje. Fomos postos à mercê de um governo descomprometido com o país e seu povo, que possibilita a morte de 100 mil brasileiros e a contaminação de 3 milhões de pessoas pela Covid-19.

Assim, diante de tanta destruição, o momento é de exigir transparência na condução da Operação Lava Jato e a dura responsabilização dos seus integrantes, que promovem a violação permanente do Estado Democrático de Direito e utilizam a estrutura repressiva do Estado para fins particulares e promoção política e pessoal.

Muitos brasileiros já foram prejudicados, reputações foram destruídas e vidas foram perdidas, como as de Dona Marisa Letícia, perseguida por ser esposa do ex-presidente Lula da Silva, ou a de Luiz Carlos Cancellier de Olivo, reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, que se suicidou após ser injusta e indevidamente encarcerado em decorrência desta nefasta operação, que segue utilizando os mecanismos judiciais de repressão para tentar calar os que lutam pelo bem do Brasil.

*Jorge Folena é advogado e cientista político. Integra a equipe de coordenação do SOS Brasil Soberano.

Você pode gostar...