Artigo: Bolsonaro, racismo e crimes de ódio

Preto (Cabeça de Negro) – Cândido Portinari, 1934


Jorge Folena*

O covarde assassinato do jovem congolês Moïse Kabagambe num quiosque na praia da Barra da Tijuca, Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro, expressa o que sempre defendeu Jair Bolsonaro: o ódio, o preconceito e a exploração da força de trabalho. Os assassinatos do congolês e o de João Alberto Silveira Freitas, também espancado até a morte por seguranças do supermercado Carrefour, em Porto Alegre, na véspera do dia da consciência negra, em 2020, representam a visão de mundo do grupo que chegou ao poder no Brasil em 1º de janeiro de 2019, com o total apoio da classe dominante.

Desde à época em que era deputado federal, o comportamento de Bolsonaro sempre foi reprovável, por se contrapor aos valores e preceitos orientadores da Constituição de 1988, que estabelece como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer formas de discriminação.

O atual ocupante da cadeira da Presidência chegou a ela ignorando tais princípios, da mesma forma que despreza a pluralidade e a convivência pacífica e, em suas ações cotidianas, incita e estimula o povo brasileiro ao ódio e ao preconceito contra os seus irmãos.

Por isso, os assassinatos do trabalhador congolês, espancado brutal e perversamente pelos donos do quiosque em que trabalhava na praia da Barra da Tijuca; o de João Alberto, no Rio Grande do Sul; ou o de Durval Teófilo Filho, também negro, assassinado ao chegar em casa, em São Gonçalo (RJ) pelo vizinho sargento da Marinha, que disse ter pensado se tratar de um assaltante, infelizmente são apenas alguns dentre os tantos assassinatos covardes cometidos no dia a dia contra a população brasileira negra e pobre.

Porém, nenhuma dessas violências provocou qualquer manifestação de repulsa por parte do governo, nem do presidente nem da suposta ministra dos Direitos Humanos. Ao contrário, apoiadores do governo e, igualmente, representantes da classe dominante (mídia incluída), tratam o assunto com superficialidade e subterfúgios, pois uma de suas missões é impedir a percepção da exploração, dos abusos e da crueldades praticados há séculos contra os negros e os trabalhadores no Brasil.

Porém, quando os atuais dirigentes da República incentivam diretamente a naturalização do racismo, estão promovendo subliminarmente o ódio e a violação à Constituição, que determina a punição de qualquer forma de discriminação atentatória aos direitos e liberdades fundamentais, como também impõe que a prática de racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão.

Em razão disso, foi editada a Lei 7.716/89, que prevê punição para os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, decorrentes do ódio. O crime de ódio ou motivado pelo preconceito está diretamente relacionado ao desrespeito à pluralidade e à diversidade, que devem saber coexistir numa sociedade sadia.

Porém, o próprio Estado brasileiro nega proteção às minorias, como se vê em relação às violências diárias praticadas contra os povos indígenas. O próprio governo faz vista grossa para a contaminação de pessoas encarceradas em lugares sem qualquer condição de dignidade, transformados em verdadeiros calabouços em que mulheres e homens jovens, negros e pobres, são jogados à própria sorte, em total desprezo aos princípios universais dos Direitos Humanos.

Então, quando o discurso oficial atua de modo a promover a disseminação de mais ódio, servindo de combustível e justificativa para o prosseguimento do extermínio de pessoas pelos aparelhos do Estado, fica patente que algo de muito maléfico e errado ocorre no país.

Sendo assim, é necessário que, a todo momento, seja denunciada essa conduta do chefe de Estado, sintomaticamente doentia e persistente no delito do ódio, que se utiliza de estratégias identicamente repressoras para afastar, ameaçar e intimidar todos os que se mostrem contrários às suas práticas belicosas, moldadas em experimentos condenados pelo Direito Internacional.

Por isso, é preciso impor um basta ao atual presidente e aos integrantes do grupo que o cerca, bem como à classe dominante, que patrocinou a chegada desse nefando grupo ao poder, por meio de um golpe que contou com a participação direta de Sérgio Moro, da Operação Lava Jato e da mídia tradicional, que se uniram para impedir a vitória de Lula da Silva na eleição de 2018.

Essas articulações foram feitas especificamente para impedir a vitória de Lula, pois ela representaria o resgate do povo pobre, negro e indígena e simbolizaria a libertação de todas e todos que nos dias de hoje são humilhados e massacrados pelo ódio, por todo o Brasil.

* Jorge Folena é advogado e cientista político, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) e da coordenação do SOS Brasil Soberano, movimento do Senge RJ

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