“Há uma guerra no Brasil”, diz Benedita da Silva


“Há uma guerra no Brasil, que é invisível aos olhos do Estado, porque é ele que a pratica”, afirmou a deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ), durante o Soberania em Debate, movimento do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge RJ). A parlamentar conclamou os eleitores a garantirem ampla participação nas eleições deste ano, não só para os executivos estaduais e federal, mas para as legislaturas. Segundo ela, uma nova composição política é chave para interromper as ações violentas e o racismo do Estado contra jovens negros no país, e para retomar um projeto de desenvolvimento, inclusão e emprego no país.

“Vamos contar os números de negros mortos de forma violenta, a situação social violenta de negros e negras”, disse. “É guerra o que temos aqui, uma guerra surda, da viuvez das mulheres, da perda dos nossos filhos, netos, dos sonhos para os filhos, que constróem seus próprios sonhos, de ser bailarina, tocar percussão, ser engenheira…”

Na opinião de Benedita, a agenda progressista deve incluir programas que valorizem a criatividade e os profissionais que moram em favelas e comunidades de periferia, junto com as grandes políticas públicas das gestões de Lula e Dilma Rousseff, como o Bolsa Família, o Minha Casa, Minha Vida, e o Mais Médicos, e a preservação das riquezas e empresas estratégicas, como a Petrobras. “As nossas reservas estão indo embora, e com tanta comida nesse país, estamos com mais de 20 bilhões de miseráveis.” Se não tivesse sido desmontado, o Programa Mais Médicos, por exemplo, teria reduzido em grande medida os impactos da covid-19 no país, observou a parlamentar, que foi autora da Lei de Emergência Cultural, destinando recursos para mitigar os efeitos da pandemia por meio de renda emergencial para trabalhadores da cultura.

Para desenvolver as potências criativas das comunidades, ele propôs a contratação e o apoio, por parte do poder público, a iniciativas feitas nos territórios, como hortas comunitárias, agricultura familiar, fomento à diversidade da cozinha local, serviços de conservação, limpeza, coleta de lixo, empreendimentos comerciais (vendedores de limão, biscoito, etc…), e a profissionais autônomos, produtores culturais, artistas.

“São projetos aparentemente simples, mas que alcançam um contingente enorme da comunidade, até que se tenha verdadeiramente condição de empregabilidade para todas essas pessoas”, argumentou. “Falar da questão ambiental, que é importantíssima dentro da comunidade, e trabalhar também a formação e qualificação para o trabalho.” Nessa direção, sugeriu, ainda, a participação do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge RJ), junto com universidades e outras categorias, como os arquitetos, em um esforço conjunto de assistência técnica a construções de habitações nas comunidades – “Minha casa segura”.

“Tem me apavorado as construções irregulares. [As pessoas]pensam que têm uma casa com segurança e não têm. Lembrei de Lula: quando fez o Minha Casa, Minha Vida, deu muitas oportunidades, principalmente nos contratos, para as comunidades de favela e periferia. Isso foi importante e estimulou muito, porque tinha ainda o Bolsa Família, as cotas universitárias, agricultura familiar; fogão, geladeira mais barata…”

Durante a entrevista, concedida em 15 de março, cerca de duas semanas antes da morte, por um câncer, do seu filho Pedro Paulo Souza Silva, Benedita se emocionou ao lembrar uma visita que fez à UERJ, primeira universidade a oferecer as políticas afirmativas de cotas. “Cheguei numa universidade onde eu ia sempre, com [plateia] toda branca, estava acostumada… e um dia olhei e vi o Brasil. Não pude contar quantos, porque era muita gente da minha cor. Eu digo com emoção. Muita gente da minha cor, dando testemunhos, dizendo: _ A mamãe, Benedita, é empregada doméstica. E outro dizia _A minha também, está estudando comigo. Eu me lembrei porque eu estudei com a minha filha, mas eu já tinha 40 anos, quando eu consegui ir para universidade particular.”

Por isso, para garantir a retomada de políticas públicas de fortalecimento popular, Benedita é enfática no que se refere às eleições deste ano para o Legislativo. “Não se pode ter dúvida, porque senão o parlamento será pior. Não tem essa de anular, não votar. _Ah, eu não quero, ninguém presta, ninguém vale nada. Tem que prestar atenção e colocar um outro Congresso lá. Onde já se viu congressista pedir para fechar Congresso? Estamos com o fascismo no Brasil. É preciso que a gente lute e lute muito para mudar o Congresso brasileiro.”

Núcleos Evangélicos do PT
Uma ação política para qualificar o debate eleitoral, contou Bené, é o trabalho do Núcleo de Evangélicos do PT, presente em 21 estados, que está discutindo nas comunidades o programa de governo do partido junto a eleitores cristãos, sem distinção de denominação. Em breve, o núcleo também vai lançar uma cartilha com a descrição das políticas públicas importantes desenvolvidas nas gestões petistas.

“Sem fé, você não realiza. Mas como provar sua fé? Com obras. Esse é o princípio do amor. Ser uma evangélica de esquerda… eu me sinto muito confortável, bem à vontade, nesse meu lugar. Porque os evangélicos sabem que eu sou petista, e o PT sabe que eu sou evangélica – sempre soube, desde a sua fundação. E o que nós estamos fazendo agora não é novidade, já fazíamos, só que sem barulho. No Partido dos Trabalhadores e das trabalhadoras há muitos evangélicos. Estamos na universidade, no serviço público, na área da saúde, da ciência… Nós evangélicos não somos os que estão na imprensa, como um rebanho que obedece ao líder.”

O objetivo dos núcleos, contudo, explicou, não é criticar os que não votaram no partido em 2018, mas aprofundar o acesso à informação para uma comparação concreta de propostas para o país. “Queremos dialogar para saber qual foi o projeto que tirou o membro da igreja do desemprego; conversar sobre os membros da igreja que, no governo Lula, foram para a universidade. Eu quero conversar sobre os evangélicos que foram beneficiados pelo Minha Casa, Minha Vida. Não quero discutir costumes, mas a Constituição e o programa de governo do Lula. Não queremos saber de que denominação a pessoa é. Pode votar em quem quiser , de preferência no Lula, mas precisa ouvir. Não podemos ser levados como boiada – não somos isso.”

> Soberania em Debate é realizado pelo movimento SOS Brasil Soberano, do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge RJ)

> Confira o Soberania em Debate com a deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ), entrevistada pela jornalista Beth Costa e pelo advogado e cientista político Jorge Folena, ambos da coordenação do SOS Brasil Soberano

 

 

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