Política de segurança “insana” promove extermínio nas favelas, diz sociológo Paulo Baía

“As políticas públicas de segurança têm uma vertente de extermínio – do inimigo, do que é periogoso para a ‘sociedade’ –, porque as favelas não são consideradas parte da sociedade”, diz o sociológo e cientista político Paulo Baía (confira no vídeo). Ele lembrou, nesse sentido, a declaração dada em fevereiro deste ano pelo ministro da Justiça, Torquato Jardim, tentando defender a intervenção federal no Rio, quando afirmou, entre outras coisas: “Você vê uma criança bonitinha, de 12 anos de idade, entrando em uma escola pública, não sabe o que ela vai fazer depois da escola. É muito complicado.”

“É neste quadro”, destacou Baía, “que nós temos a fala do ministro da Justiça, que justifica o assassinato de um adolescente na Maré e o próprio fato de se considerar normal o assassinato de um jovem, caindo numa discussão bizarra sobre de onde partiu o tiro. Porque pouca importa; o que importa é que cada vez mais jovens, mulheres, meninas são exterminadas nessa política insana.”

Apesar das muitas vozes indignadas com o assassinato do adolescente Marcos Vinicius da Silva, de 14 anos, quando estava a caminho da escola, na Maré, no último dia 20 junho, a juíza Ana Cecilia Argueso Gomes de Almeida, da 6ª Vara de Fazenda Pública do Rio, negou no dia 21 a liminar para impedir disparos de aeronaves em ações das forças de segurança, como os helicópteros que deram rasantes em operações recentes na comunidade. A Defensoria Pública e o Ministério Público haviam solicitado liminar para para proibir tiros de aeronaves em favelas ou lugares densamente povoados. “A probabilidade de atingir pessoas inocentes é imensa, além do terror psicológico que causa aos moradores e interrupção das atividades na comunidade e prejuízos materiais”, afirmou o defensor público Daniel Lozoya. A Defensoria Pública informou que recorrerá da decisão.

Para a jurista Carol Proner, o Judiciário poderia evitar mais mortes como a de Marcos Vinicius. “Curioso o ativismo do poder judiciário que, por vezes, desativa”, escreveu em seu perfil no Facebook. “Talvez seja necessário recordar que as Convenções de Genebra, jus cogens universal, proíbem o uso da força indiscriminadamente mesmo em contexto de guerra, sob pena de vitimar população civil. Acaso o dever de proteger que inspira o direito humanitário não deveria inspirar também a magistrada?”

Uniforme manchado de sangue

“Ele falou ‘eu sei quem atirou em mim, eu vi quem atirou em mim, foi o blindado, ele não me viu com a roupa de escola’”, contou Bruna Silva, mãe de Marcos Vinícius. A imagem do uniforme do colégio machado de sangue tornou-se ícone da covardia policial. “Essa é a bandeira do meu filho, é com ela que eu vou fazer justiça”, disse, durante o velório, erguendo a camisa de Marcus. A mãe encontrou o menino ainda com vida, e ficou com ele até a chegada da ambulância, que, segundo ela, demorou cerca de uma hora. O menino queria ser músico, MC profissional, e já compunha suas próprias letras de funk. Acordou às 8h da manhã, saiu atrasado para o colégio, no meio do caminho percebeu a operação da polícia e tentou voltar. Não deu tempo. Morreu a cem metros da sua casa. Por volta das 9h teria começado a operação na Maré, que contou com mais de cem policiais e apoio logístico do Exército.

Dois dias depois, num sábado (22), outro jovem, da mesma idade, foi executado na Vila Vintém. O rapaz estava na calçada, quando homens atiraram contra ele de dentro de um carro.

Segundo a ONG Rio de Paz, ao menos 50 crianças de até 14 anos foram assassinadas pelas chamadas “balas perdidas”, expressão que soa a deboche com as vidas, elas sim perdidas, desde 2007, no Estado. Em 2018, já foram oito.

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