“Não há como fazer um projeto de desenvolvimento nacional sem dar relevância à pauta da cultura”, afirma a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ), pré-candidata à reeleição, e autora, junto com outros cinco parlamentares, da Lei Aldir Blanc 2, cujos vetos presidenciais o Congresso derrubou nesta terça (5). Junto com a Lei Paulo Gustavo, prevê recursos e um auxílio-emergencial para o setor da cultura pelos próximos cinco anos. Segundo a parlamentar, a cultura contribui, no mínimo, com cerca de 6% do PIB nacional. “Não há nenhuma nação desenvolvida que possa ter desprezado esse assunto”, destaca o pré-candidato a deputado estadual, Leonardo Giordano (PCdoB-RJ), ex-secretário das Culturas de Niterói e vereador em quinto mandato na cidade.
A cultura está na cadeia de produção de muitos eventos importantes para o país e envolve tecnologia intensiva, do artesão ao audiovisual, integrada à educação e à comunicação democrática, diz Jandira. “É preciso dar valor ao Brasil nesse aspecto, que gera muito emprego, renda e uma larga cadeia de produção. Quando dizemos que a cultura tem 6 milhões de trabalhadores, na verdade, é muito mais do que isso. Se juntar todo o pessoal dos pontos de cultura, do São João do Nordeste, a cadeia produtiva do Carnaval, as aldeias indígenas, os quilombolas, os terreiros afro brasileiros, se pegar tudo isso, que não está computado no IBGE, nas estatísticas oficiais, são mais alguns milhões de pessoas. E há uma outra cadeia que depende dessa: desde o pipoqueiro que vende na porta do cinema, o bilheteiro, até todos os bares, restaurantes, hotéis.”
A Lei Aldir Blanc, da qual Jandira foi relatora, em 2020, e agora a Aldir Blanc 2 conseguiram, na avaliação da parlamentar, reconhecer essa dimensão econômica da cultura. “Estávamos falando da sobrevivência dessa turma, por isso foi uma lei emergencial: R$ 3 bilhões para as pessoas”, justifica, citando os teatros fechados, a ausência de público para artes de rua como circo e rodas de samba, os bares fechados. “O pessoal está passando fome. A dimensão econômica da cultura veio à tona e vimos o quanto ela fez falta no PIB brasileiro.”
Identidade e soberania
O pré-candidato a deputado estadual Leonardo Giordano observa o papel “nevrálgico, decisivo” da cultura para a afirmação de uma nação soberana. “Não é à toa que, no projeto de desconstituição da soberania nacional, a cultura é tão atacada como alvo do Bolsonaro, que vem fazendo tanto para detonar as políticas públicas da área da cultura e para desarranjar esse setor”, aponta. “A disputa que fazem conosco também é cultural. Existe a cultura do racismo, da homofobia, da violência como um todo… das armas, do machismo. Esses caras estão combatendo em termos culturais.”
Segundo Giordano, o bolsonarismo ataca a produção cultural brasileira e a identidade nacional para poder emplacar no país um projeto subalterno. “Se a gente está falando de soberania, tem que denunciar sempre o bolsonarismo e essa gente como agentes de um plano internacional. Não combatemos só as fake news. Elas são a ponta de um iceberg, elas são a Cambridge Analytics, elas são Steve Bannon. Estamos falando de uma disputa de comunicação e cultural.”
É nesse contexto que se dá, diz o ex-secretário das Culturas, “a subversão” dos símbolos nacionais. “Se enrolam na bandeira do Brasil para detonar o país e vender o país a preço de banana para potências estrangeiras. E nós que defendemos a cadeia produtiva da cultura, a soberania nacional nas suas várias dimensões de arranjos econômicos, nós que defendemos que o país tenha estatais que possam oferecer os serviços públicos fundamentais para a população e garantir os direitos do povo, nós é que somos os verdadeiros patriotas. Até nisso há uma armadilha cultural, que é a apropriação dos símbolos culturais para detonar com o Brasil.”
Plataforma de ação
Para derrotar esse projeto de subalternidade, que ameaça a democracia e a Constituição, Jandira elenca propostas que compõem o núcleo programático das diretrizes apresentadas pela frente ampla da pré-candidatura de Lula à Presidência. Cita o combate à fome – por transferência de renda e pela valorização do trabalho, com salários e direitos, o que não impede programas assistenciais emergenciais; revisão das reformas trabalhista e previdenciária; recuperação de instrumentos estratégicos para o desenvolvimento, como a Eletrobras, que foi privatizada, e a Petrobras; investimentos em inovação; uma política internacional que recomponha o bloco Sul-Sul, as alianças com a Ásia e a África, e com os países do Brics; políticas universais fortes em educação, saúde ciência; políticas industriais e parcerias público-privadas; investimentos em infraestrutura e logística; fortalecimento do bancos públicos como financiadores; medidas para reforma urbana e agrária; apoio à agricultura familiar como caminho de sustentabilidade para uma política de alimentos; enfrentamento da questão ambiental; políticas culturais integrando questões de gênero e raça.
No caso específico do Rio de Janeiro, o pré-candidato a deputado estadual, autor de mais de 60 leis na Câmara de Niterói, estrutura um programa para o estado, onde, segundo ele, 1,4 milhão de famílias vivem com uma renda média mensal por pessoa inferior a R$ 100,00. Esse programa se distribui em três eixos: institucional, econômico e social.
“A primeira questão, gravíssima, é a desconstituição da própria institucionalidade”, diz Giordano. “O que o Bolsonaro faz de mal ao Brasil, comprando as pessoas, potencializando o Centrão com orçamento secreto, e os grupos armados, no Rio, é sempre pior – tem as milícias, uma deterioração ainda mais grave.” Contra esse quadro, ele defende um “compromisso firme de não compactuar” com essas práticas, para “recuperar a normalidade institucional”.
O segundo ponto relevante na plataforma do pré-candidato envolveria um projeto de desenvolvimento, com geração de emprego. “Tem a ver com a resolução das contas públicas, retomar a capacidade de arrecadação no estado e a geração de empregos no Rio de Janeiro. Vamos pensar em um complexo estadual da saúde, uma área que se encontra subdesenvolvida, com grande potencial; nas parcerias com as universidades; nas vocações regionais para investimentos, atrair atividades indutoras, construir uma repactuação do pacto federativo para ter investimentos sérios no Rio.”
Segundo Giordano, o atual Regime de Recuperação Fiscal “é uma fraude”, que vai retornar para a sociedade fluminense na forma de cobrança de juros – “todo o dinheiro que o governo federal deixa de arrecadar, isso volta como dívida”.
O terceiro eixo “e o mais importante”, na avaliação do ex-secretário municipal, é o social: “lançar programas e ações que criem uma rede proteção social no Rio; construir rapidamente políticas públicas e soluções que deem conta do problema da fome, do desalento, do desamparo”. Essas iniciativas, diz Giordano, podem se dar por meio de frentes de trabalho, políticas públicas de assistência social direta, de transferência de renda ou de economia solidária, desde que “respondam ao desafio da miséria e da pobreza no Rio”.
Indústria naval
A indústria naval tem um papel chave nesse esforço. Giordano lembra que os estaleiros fluminenses chegaram a ter milhares de trabalhadores durante a gestão Lula, como efeito da política de conteúdo local da Petrobras. “As encomendas da Petrobras voltaram a ser feitas no exterior. É um crime de lesa-pátria, porque estão tomando decisões sobre o menor pagamento imediato pelas encomendas, desconsiderando que, depois que você faz a quarta e quinta encomenda, você desenvolve tecnologia, gera emprego. E, progressivamente, cada plataforma, cada construção naval feita no Brasil terá um preço menor.”
Ou seja, com o tempo, toda a cadeia industrial do país – direta e indireta – se torna mais competitiva, gerando emprego e aumento de arrecadação fiscal. Resgatar a Petrobras para seu papel soberano, como indutora de desenvolvimento, sem jogar contra a economia nacional – por exemplo, com os aumentos de gás e combustível ditados pelos preços internacionais – é uma das grandes expectativas de Giordano com relação a um próximo governo Lula.
Outro aspecto importante para o Rio de Janeiro, diz ele, envolve o regime de tributação, particularmente desfavorável ao estado. “Os únicos dois casos em que não se cobra ICMS na fonte são energia elétrica e petróleo. Isso acerta o Rio no coração, porque sua principal riqueza é petróleo. No nosso caso, temos um regime diferenciado em prejuízo do estado, o que precisa ser repactuado com o governo federal”. Segundo Giordano, é preciso pautar a Lei Kandir e a indústria naval, dentro de um projeto estadual de desenvolvimento. Para tanto, ressalta, “esta é a eleição das nossas vidas. ”
> Soberania em Debate é realizado pelo movimento SOS Brasil Soberano, do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge RJ)
> Confira o Soberania em Debate com a deputada federal e pré-candidata à reeleição Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e com o vereador, ex-secretário de Culturas e pré-candidato a deputado estadual Leonardo Giordano (PCdoB-RJ), entrevistados pela jornalista Beth Costa e pelo advogado e cientista político Jorge Folena, ambos da coordenação do SOS Brasil Soberano