Nesta semana infeliz de julho de 2017, presenciamos o assassinato dos sonhos e das esperanças de um povo explorado, que viu revogada a legislação social do trabalho (CLT) por um parlamento que representa somente os interesses dos muito ricos, e assistimos, mais uma vez, as manifestações de ódio contra o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva, pelo cometimento do “crime” de alimentar o corpo e a autoestima de quem antes nunca teve vez no Brasil.
Os povos primitivos manifestam um tabu pelo qual se deve respeitar os inimigos, ainda que abatidos pela morte decorrente da disputa. Freud, em Totem e Tabu (obras completas volume 11, Companhia das letras, p. 71) expressa que “esses povos são dominados por um supersticioso medo dos espíritos dos homens abatidos (…) e neles enxergamos expressão de arrependimento, de apreciação do inimigo, de má consciência por ter-lhe tirado a vida. Quer nos parecer que também nesses selvagens está vivo o mandamento ‘Não matarás’, que não pode ser violado impunemente, muito antes de qualquer legislação comunicada por um deus.”
O juiz primitivo do Paraná desconhece o direito natural dos povos primitivos de respeitar os inimigos e, tal qual Nêmesis, tem sua mente contaminada pelo desejo de abater física e moralmente aquele a quem elegeu como seu inimigo, imaginando que irá ficar impune.
Juízes como este, ao invés de purificarem seus espíritos, servem de instrumento do ódio e praticam o mais duro deboche contra o povo simples e humilhado. Pois quase ao mesmo tempo em que se levanta o estandarte da condenação de Lula, livram da cadeia vários políticos malfeitores e lhes devolvem seus mandatos parlamentares para que possam aprovar uma draconiana reforma trabalhista, que corta direitos de trabalhadores e trabalhadoras, lançando-os em uma quase escravidão.
Condenar Lula, da forma como a anunciada, para satisfazer os interesses políticos de seus inimigos e para impedi-lo politicamente de disputar uma eleição, exigirá um severo ato de expiação e purificação, o que não é possível para esse juiz e para os demais envolvidos, no governo e no parlamento.
O juiz do Paraná não tem consciência dos rituais do tabu para libertar pelo mal causado ao homem abatido, como ressaltado por Freud. O certo é que, na tradição dos povos originários, deve-se respeitar com muito zelo os inimigos; caso contrário, o espírito daquele que desonra o tabu arderá no fogo e os fantasmas rondarão sua mente, como descrito nas peças Hamlet, Macbeth e Ricardo III, de Willian Shakespeare.
O ódio desmedido já matou a mulher de Lula, violenta seus descendentes e serve de pretexto para eliminá-lo politicamente; porém, tudo isto não atinge somente o ex-presidente, mas principalmente os mais de quarenta milhões de brasileiros que saíram da linha da miséria e hoje regressam a essa triste posição.
Com efeito, “os homens são artífices de sua própria história”; e a história que esses juízes e parlamentares constroem para si é muito triste, pois se apresenta tomada de rancor e preconceito.
Por tudo isto, a história será implacável contra todos os que utilizam o ódio como instrumento de vingança política.
Jorge Rubem Folena de Oliveira – Advogado e cientista político