O ministro da Economia, Paulo Guedes, revelou em entrevista à Folha de S.Paulo de hoje (16) que o presidente Jair Bolsonaro tinha em mãos, pelo menos há uma semana, projeção estatística feita pelo Banco Central, alertando para o ritmo acelerado de contágio da Covid-19 no Brasil. Dados que o próprio ministro classificou de “alarmantes”: uma expectativa de contágio de até 80% da população (na China e na Itália, foi estimada em 60%). De posse desses dados, que não foram divulgados para a sociedade, o que fez o governo desde então? O presidente da República ridicularizou as medidas de segurança do Ministério da Saúde, e Paulo Guedes se aproveitou da crise para pressionar o Congresso a aceitar suas reformas (privatizações, novas perdas de direitos trabalhistas, desmonte do Estado, fim dos fundos não constitucionais de investimentos, novo pacto federativo, etc.).
Supondo que o BC tenha levado no mínimo uma semana para produzir a projeção da evolução do contágio, temos que Bolsonaro, mesmo de posse dessa informação há 15 dias, foi às ruas no domingo (15) durante sua própria quarentena, cumprimentou apertando a mão e tirando fotos com apoiadores, e ainda chamou de “histeria”, em entrevista à CNN Brasil, as diretrizes de distanciamento social dadas pelo Ministério da Saúde.
Se isso não é crime de responsabilidade gravíssimo, nada mais será.
Outro aspecto chocante da entrevista é a reação de Guedes, que passou a se dedicar em tempo integral a uma estratégia oportunista, que garantisse a aprovação rápida das suas reformas no Congresso. Alternativas para atenuar o sofrimento da população durante a crise da Covid-19 não entraram na sua lista de prioridades.
Diante do cenário grave a que foi apresentando, “o que o senhor fez, a partir daí?”, pergunta a Guedes a repórter da Folha de S.Paulo. “A gente tinha 15 semanas, até o início da campanha eleitoral, para aprovar as reformas. Quando começou o bafo lá fora do coronavírus, minha mensagem foi reforçar a importância das reformas. (…) Apresentei 16 reformas — uma por semana. Minha primeira reação à crise do coronavírus foi estruturante: reforçar o sistema imunológico da economia.”
Segundo Guedes, na mesma entrevista, o relatório foi um dos temas da reunião com parlamentares na última semana, no dia 11, em que estiveram presentes o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, líderes partidários do Congresso, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, o da Economia, Paulo Guedes, e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. A projeção do contágio, utilizando sofisticados modelos matemáticos, foi feita pelo BC a pedido do ministro Mandetta — e não se sabe quando foi concluída e entregue a Bolsonaro.
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