Em reunião que se estendeu pela madrugada de domingo (21), os integrantes do Conselho Pleno da OAB, representando as entidades nos estados, votaram pela abertura de processo de impeachment contra o presidente Michel Temer, por crime de responsabilidade. O Conselho acolheu a avaliação da comissão especial que analisou as provas do inquérito. Foram 25 votos a favor e apenas uma divergência e uma ausência. O pedido deve ser protocolado na Câmara dos Deputados na próxima quarta-feira (24) ou quinta-feira (25). Para o dia 24, movimentos sociais, Frente Brasil Popular, Frente Povo sem Medo e centrais sindicais marcaram o #OcupaBrasília, ato que deve reunir cerca de 100 mil pessoas contra o governo e as reformas trabalhista e da Previdênia, e por Diretas Já.
“Estamos a pedir o impeachment de mais um presidente da República, o segundo em uma gestão de 1 ano e 4 meses", lamentou o presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia. "Tenho honra e orgulho de estar nessa entidade e ver a OAB cumprindo seu papel, mesmo que com tristeza, porque atuamos em defesa do cidadão, pelo cidadão e em respeito ao cidadão.”
De acordo com a comissão especial, convocada pela diretoria da OAB Nacional, Temer teria falhado ao não informar às autoridades competentes a admissão de crime por Joesley Batista, e faltado com o decoro exigido do cargo ao se encontrar com o empresário sem registro na agenda e ao ter prometido agir em favor de interesses particulares. O parecer foi lido por Flávio Pansieri, relator da comissão, que também teve a participação de Ary Raghiant Neto, Delosmar Domingos de Mendonça Júnior, Márcia Melaré e Daniel Jacob.
Para Lamachia, a atual crise brasileira é sem precedentes sob todos os aspectos. Ele explicou que a reunião extraordinária só foi convocado, após ele ter assegurado acesso aos autos do processo que investiga Temer no Supremo Tribunal Federal, uma vez que não o faria baseado apenas em notícias de jornal.
Os conselheiros federais se revezaram ao microfone, apontando aspectos insustentáveis das atitudes de Temer. Conderam o encontro do mandatário da República com um empresário investigado em mais de cinco operações da Polícia Federal e o conteúdo dos diálogos travados. Os advogados concluíram que, ao não denunciar Joesley após ele admitir ter corrompido dois juízes e um procurador, Temer faltou com o decoro e feriu a Lei do Servidor Público. Também teria agido em favor dos interesses pessoais do empresário em detrimento do interesse público.
Aos advogados do presidente em exercício – Gustavo Mendes e Carlos Marun (PMDB-MS) -, que fizeram a sua defesa, os conselheiros federais recusaram o pedido de mais tempo para análise dos fatos. Para a OAB, como o pedido de abertura de processo de impeachment não é um julgamento em si, a defesa deverá ser feita no Congresso Nacional. Os advogados falaram por cerca de 20 minutos e foram convidados a se manifestar novamente durante a análise do mérito da questão.
Parecer
Para a comissão especial que analisou os fatos relativos ao encontro com o sócio da J&F, Joesley Batista, o presidente da República infringiu a Constituição da República (art. 85) e a Lei do Servidor Público (Lei 8.112/1990) ao não informar à autoridade competente o cometimento de ilícitos. Joesley informou ao presidente que teria corrompido três funcionários públicos: um juiz, um juiz substituto e um procurador da República. Michel Temer, então, ocorreu em omissão de seu dever legal de agir a partir do conhecimento de prática delituosa, no caso, o crime de peculato (Código Penal, art. 312).
“Se comprovadas as condutas, houve delito funcional em seu mais elevado patamar político-institucional. Há dever legal de agir em função do cargo. Basta a abstenção. São crimes de mera conduta, independentemente de resultado”, afirmou Pansieri. “O que fizemos hoje foi tentar romper com o que a percepção do ‘assim é que sempre foi’ e elaboramos esse parecer. OAB e a história da entidade está acima de nossas histórias pessoais. Viemos aqui para fazer a coisa certa, em prol de um país diferente.”
Segundo a Lei do Servidor Público, em seu art. 116, é dever levar as irregularidades de que tiver ciência em razão do cargo ao conhecimento da autoridade superior ou, quando houver suspeita de envolvimento desta, ao conhecimento de outra autoridade competente para apuração.
O presidente da República também teria procedido de maneira incompatível com o decoro exigido do cargo, condição previstas tanto na Constituição da República quanto na Lei do Impeachment (Lei 1.079/1950), por ter se encontrado com diretor de uma empresa investigada em 5 inquéritos. O encontro ocorreu às 22h45, fora de protocolo habitual, tanto pelo horário quanto pela forma, pois não há registros formais do encontro na agenda do presidente.
Na conversa entre Temer e Joesley se verifica esforço aparente em se buscar nome favorável aos interesses da companhia para atuar como presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômico (Cade) e por favorecimento junto ao ministro da Fazenda. Isso também seria falta de decoro por interceder a favor de interesses de particulares, em detrimento do interesse público.
A OAB do Rio de Janeiro foi a primeira a declarar publicamente seu apoio ao impeachment antes mesmo da reunião do Conselho do Pleno. E decidiu manter seu prédio com iluminação de cor preta, em sinal de luto, até que Temer seja afastado da Presidência.