Jorge Folena*
A proposta do governo federal de tributar, até 30 de junho de 2023, as exportações de petróleo cru (“óleos brutos”), passando de 0% para 9,2%, está causando alarde excessivo entre os entreguistas das riquezas do país, que consideram absurda a iniciativa de defesa do interesse nacional, apresentada pela Medida Provisória 1.163/2023. Essas pessoas manifestam que o imposto de exportação não tem caráter arrecadatório e que sua cobrança será prejudicial para a venda do “produto” nacional no exterior.
Vale dizer que esta lógica é válida para os produtos efetivamente industrializados no país, que podem não ser tributados visando concorrer no comércio internacional com os fabricados em outros países.
Na questão em análise estamos falando de matéria prima, que apenas foi extraída e não passou por processo de industrialização, por meio do qual atingiria sua essência final, sendo transformada em derivados de petróleo.
Ocorre que o colonialismo, na sua lógica exploratória, sempre impôs aos países colonizados a obrigação de enviar para as sedes coloniais as matérias primas, sem valor agregado, para lá serem industrializados e depois retornarem para as colônias com valores superiores, alimentando assim o já excessivo processo de acumulação de riquezas dos países produtores, em detrimento das nações detentoras originárias das riquezas naturais.
Esta tem sido a saga do Brasil, ao longo de grande parte do processo de submissão ao subdesenvolvimento, que se inicia pela exportação de pau-brasil, passa para a cana-de-açúcar, depois ouro, café, minério de ferro e, mais atualmente, soja, que foram e são industrializados nos países de destino, gerando riqueza e desenvolvimento para eles somente, em detrimento do povo brasileiro, mantido permanentemente numa vida de pobreza e ausência de perspectivas.
É o que Ruy Mauro Marini demonstra nos seus estudos sobre a teoria da dependência, pela qual os países da América Latina são destinados a apenas exportar suas riquezas naturais (a preços baixíssimos e, logicamente, sem tributar), gerando desenvolvimento, riqueza e ganhos para os países importadores, que então ampliam o seu processo de industrialização e prosperidade e, pelo outro lado, enfraquecem cada vez mais a soberania dos países exportadores das matérias primas, nos quais se ampliam a desigualdade e a pobreza.
Ao contrário do que manifestam os prepostos do colonialismo, o processo de exportação de petróleo (óleo cru, que nada tem a ver com derivados refinados, que passaram por processo de industrialização), sem pagamento de imposto de exportação, que depois retorna processado e muito mais caro, não incentiva a indústria nacional nem cria empregos, apenas nos atrela ao subdesenvolvimento, à dependência e ao atraso sem fim.
A exportação de matéria prima (óleo cru) é contrária ao interesse nacional, uma vez que esse óleo poderia ser refinado nas refinarias nacionais para produzir produto acabado e com valor agregado, visando atender às necessidades do desenvolvimento nacional e da população brasileira. Desse modo, o governo poderia oferecer combustíveis e gás de cozinha a preço justo e razoável, por sermos um país com grandes reservas de petróleo, que não necessita ter o preço do produto final (gasolina, diesel etc) vinculado aos preços internacionais, sendo tal política válida apenas para nações que não dispõem desta riqueza natural em abundância. Com relação às refinarias nacionais, convém não esquecer que foram indevidamente privatizadas por governos sem compromisso com o desenvolvimento do Brasil.
A lógica da exportação de óleo bruto, sem tributação, que depois retorna ao Brasil em forma de refinados e derivados de petróleo, obrigando os brasileiros a pagar mais caro por produtos que poderiam ser fabricados no território nacional e por nossos qualificados petroleiros, atenta contra os interesses do país e contra a nossa soberania, sendo prejudicial ao desenvolvimento nacional e à construção de uma sociedade livre, justa, solidária, sem pobreza, desigualdades e com pleno emprego, princípios fundamentais previstos nos artigos 1º, 3º e 170 da Constituição Federal.
Por tal razão, a cobrança de imposto de exportação, de modo temporário, como previsto na Medida Provisória 1.163/2023, não atenta em nada contra a Constituição Federal. Ao contrário, é medida salutar, que propõe fortalecer a indústria nacional, de modo a beneficiar os trabalhadores do país e restabelecer nossa soberania, por meio de uma “ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, (que tenha) por fim assegurar a todos a existência digna, conforme os ditames da justiça social”, como ajustado no caput do artigo 170 da Constituição Federal.
* Jorge Folena é advogado e cientista político, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) e da coordenação do SOS Brasil Soberano, movimento do Senge RJ