“As eleições deste ano vão decidir o destino do país por mais 30 ou 40 anos, e são as mais importantes para o Brasil desde o fim do regime militar. A chave da questão é o seguinte: se não tivermos democracia no próximo período, não vai mais haver democracia para ninguém, e por um longo tempo no país.” A advertência é de Tarso Genro, ex-ministro da Justiça, da Educação e de Relações Institucionais no governo Lula, durante o Soberania em Debate do último dia 29 de setembro, quase véspera do primeiro turno das eleições presidenciais. Ele ressaltou que a vitória de Lula “é substancial para o futuro dos nossos filhos, dos nossos netos e do que nos resta da nossa vida”.
Tarso Genro convocou a sociedade a se mobilizar e se unir contra o fascismo para garantir as bases de que o Brasil precisa para ser uma nação mais coesa, num projeto de destino nacional democrático, popular, de Estado social, que comece a estabilizar no país os direitos de cidadania. “Estamos à beira de um abismo. Mas ele não é intransponível, e, felizmente, não é intransponível ainda pelos meios democráticos de que dispomos a partir da Constituição cidadã”, enfatizou o ex-ministro, que também foi duas vezes prefeito de Porto Alegre e governador do Rio Grande do Sul. Segundo ele, a questão, neste momento, “é saltar sobre este abismo: eleger um presidente comprometido com a democracia”.
Nesta eleição, que o ex-ministro classifica como “épica”, ele acredita que nem todos os que votam no atual presidente sejam fascistas, mas há também segmentos sociais excluídos, que precisam encontrar outras formas de representação. “As contingências eleitorais são compostas por fios invisíveis que vão formando as identidades políticas e sua base eleitoral. É claro que há um núcleo racional fascista que incorpora ideólogos do fascismo e psicopatas reconhecidos que trabalham com a política do ódio para cooptar uma determinada parte dessa base social. Mas não temos 30% de fascistas e nazistas no país. Nós temos um enorme massa de pessoas desestruturadas do ponto de vista político ou psicologicamente, ou com um modo de vida levado à exclusão da sociedade formal, que são presa fácil desse tipo de demagogia de extrema direita.”
Programa de governo
Apesar do largo arco de alianças formado para dar suporte à eleição de Lula, em que não há necessariamente unidade programática, Tarso Genro aponta três pautas que um novo governo democrático pode e deve abordar de imediato. “Primeiro, é acabar com a fome novamente”, afirma. “Em segundo, é tratar da questão da segurança pública, de uma maneira integrada e federativa. A terceira é uma política externa comum com nossos parceiros latino-americanos.”
Tarso defende a pactuação de condutas comuns a serem adotadas pelo bloco, que fortaleçam os seus integrantes nas relações internacionais. Ele observa, por exemplo, que a política externa do Chile será mais próxima dos EUA, enquanto a do Uruguai envolverá laços mais estreitos com a China, interessada nos vastos territórios disponíveis para “plantation”, produção de alimentos. “O Brasil vai ter que ser um árbitro e um sustentáculo dessa política unitária”, diz.
“O Brasil tem que liderar uma aliança política sul-americana com tendência de se constituir latino-americana, que envolva presidentes da República desde a esquerda, como o Petro [Gustavo Petro, presidente da Colômbia], até a direita democrática, para a qual não interessa o fascismo e o golpe de Estado, para pactuar um conjunto de relações aqui na América do Sul, que apontem para um relacionamento exterior relativamente unitário, com condutos negociados, no exterior. Porque não há saída para a América Latina sem um mínimo de unidade para pleitear dos países globais relações mais estáveis de financiamento, de investimento. Políticas que não coloquem a América Latina, em situação semelhante à que ocorreu na Europa Oriental, em que as guerras internas entre micro e pequenas nacionalidades de países geraram uma colcha de retalhos que levou a uma sucessão de micro-estados nacionais, hoje permanentemente em situação belicosa.”
Já na segurança pública, o ex-ministro da Justiça propõe o uso de mecanismos federativos, em um projeto federal. Uma iniciativa que poderia ser similar ao Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), criado no governo Lula, no ministério do próprio Tarso Genro, para diminuir os indicadores de criminalidade nas regiões metropolitanas mais violentas do Brasil, destinando recursos a projetos nos estados, por meio de convênios. Segundo ele, “um sucesso extraordinário” nos estados que aderiram.
Por enquanto, a maior preocupação de Tarso é com a campanha eleitoral. “É nos proteger e proteger nossos camaradas que estão na luta, nas ruas. Não aceitar provocações, porque eles [os adversários] estão armados e vão tentar provocar incidentes. Então é preciso sair em grupos, ter cuidado, não aceitar a violência. E temos que procurar os indecisos, chamar as pessoas para votar. Essa é a questão chave. Com isso, vamos consolidar a vitória. Esse é nosso dever cívico, dever de mulheres e homens de esquerda que estão lutando pela recuperação democrática do nosso país e pela volta do Lula a ser o magistrado político da nação.”
> Soberania em Debate é realizado pelo movimento SOS Brasil Soberano, do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge RJ)
> Confira o Soberania em Debate com o ex-ministro Tarso Genro, entrevistado pela jornalista Beth Costa e pelo advogado e cientista político Jorge Folena, ambos da coordenação do SOS Brasil Soberano