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Quinta-feira, às 16h

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As lutas antifascistas e antirracistas e o “Fora Bolsonaro!”

São Paulo – 13/6/2020- Manifestação pede o “fim do Governo da Morte” – Foto: Felipe Campos Mello/Fotos Públicas

Rafael Araujo*

Antiglobalismo, misoginia, posturas antidemocráticas, desrespeito às minorias, rechaço ao meio ambiente, proselitismo da anti-ciência, glorificação da violência e aproximações com o discurso e as práticas fascistas. Misturados, esses são alguns dos elementos que compuseram a química entre Donald Trump e Jair Bolsonaro.

A admiração do presidente brasileiro por Trump ficou evidente desde a campanha eleitoral de 2018. E isso se acentuou no início do seu governo. Bajular os Estados Unidos e o seu mandatário tornou-se política de governo desde 1º de janeiro de 2019. Em nossa história, nunca um presidente assumiu de maneira tão incisiva tal postura submissa e subserviente.

A adulação de Trump pelo governo brasileiro foi intensificada durante a pandemia mundial da Covid-19. O negacionismo em relação à mortalidade da doença; a polarização entre salvar vidas ou a economia; e a defesa da cloroquina e hidroxicloroquina enquanto medicamentos de efetivo combate ao vírus, contrariando todas as pesquisas científicas acerca do tema, foram algumas das diversas ações caricaturais de Bolsonaro na bajulação de Trump.

Se Bolsonaro, ao seguir o “manual trumpista” sobre as ações contra a Covid-19, quis demonstrar a sua subserviência (ou a sua ignorância!), ele conseguiu. Hoje, oficialmente, o Brasil tem cerca de 1,1 milhão de infectados e de 51 mil mortos. Concentramos mais da metade do número de casos e de falecimentos da América Latina. Mundialmente, em números absolutos sobre ambos, só perdemos para os Estados Unidos. A negação da ciência, que tanto aproxima Bolsonaro e Trump, mostrou, infelizmente, a sua efetividade.

Porém, não são apenas estes elementos que unem Brasil e Estados Unidos. O racismo estrutural permeia diversas páginas das nossas histórias. O passado escravista enraizou em nossas sociedades o profundo preconceito contra os negros. Em razão disso, os assassinatos de João Pedro, em São Gonçalo (RJ), no dia 18 de maio, e de George Floyd, uma semana depois, em Mineápolis, não são lamentáveis eventos que guardam entre si uma proximidade temporal. Consistiram em brutais ações que expressaram, cruelmente, o racismo que tanto vincula brasileiros e norte-americanos.

Por isso, os dois países foram sacudidos, nas últimas semanas, pelo levante da juventude negra e popular. Nos dois casos, as manifestações foram apoiadas por parcelas democráticas e antirracistas da sociedade civil. Se nos Estados Unidos, símbolos do colonialismo e do racismo foram atacados, como as estátuas de Cristóvão Colombo ou de Jefferson Davis – presidente do exército confederado que defendia a manutenção da escravidão durante a Guerra Civil norte-americana, entre 1861-1865 -; no Brasil, as ações do movimento negro e da juventude da periferia contaram com a colaboração dos setores democráticos das torcidas organizadas, que se mobilizaram contra o governo Bolsonaro desfraldando a bandeira do antifascismo.

Combinamos, dessa forma, as pautas antifascista e o antirracista nas mobilizações. Estas demonstraram à extrema-direita brasileira e ao seu principal fiador político, Jair Bolsonaro, que o “fascismo tupiniquim” não tem o protagonismo nas ações de rua. Mais do que isso. Em um momento no qual o bolsonarismo enfrenta reveses na justiça, em virtude do inquérito das fake news promovido pelo STF e pelas investigações contra deputados ligados ao presidente, a combinação das lutas antifascistas e antirracistas pode reacender o movimento de massas e propiciar o aprofundamento do enfraquecimento do governo Bolsonaro, hoje acuado pelas investigações do Judiciário e pela prisão de Fabrício Queiróz na casa do advogado da sua família, Frederico Wassef, na última semana.

Mais do que nunca, o “Fora Bolsonaro” deve combinar as bandeiras antifascista e antirracista com pressões por efetivas medidas econômicas e sociais que mitiguem os efeitos da pandemia nos setores mais vulneráveis de nossa sociedade. Hoje, o Brasil tem 26 milhões de desempregados. A economia retrocedeu quase 16% por conta da pandemia. Os problemas reais da nossa sociedade não serão resolvidos com verborragias golpistas ou a austeridade fiscal de Paulo Guedes. Mas com políticas públicas efetivas, que não podem ser feitas pelo “Trump dos Trópicos” e o seu séquito de colaboradores civis e militares.

* Rafael  Araujo é professor adjunto de História da América da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Membro da Universidade Emancipa.