Durante o Soberania em Debate, o deputado defendeu uma frente democrática ampla e um projeto progressista baseado no combate à desigualdade e no resgate da Constituição de 88
“O negacionismo tornou-se política oficial no Brasil”, afirmou o deputado federal Marcelo Freixo (Psol-RJ), durante o Soberania em Debate realizado na última sexta-feira (5), com o historiador Francisco Teixeira, coordenador do Movimento SOS Brasil Soberano. “Se você nega coisas básicas, como o sofrimento indígena, a dificuldade dos quilombolas, a violência no campo, você pode negar tudo. É uma estratégia política.”
O objetivo dessa negação absoluta de obviedades e evidências, inclusive da pandemia de Covid-19, diz o deputado, é deslocar a disputa da verdade dos lastros factuais para as redes sociais. “A verdade passa a ser disputada nas redes sociais — não à toa a criminalização da imprensa, a violência contra jornalistas”, explica. “É a ideia de que não há mais fato histórico ou jornalístico, muito importante para um projeto autoritário. Você pode então governar a partir de qualquer realidade. Não tem pandemia, são 36 mil mortos mas não tem. Ou faz como o Crivella [prefeito do Rio] e muda a contagem dos mortos. São formas de construir outra narrativa de sociedade.”
De fato, no sábado (6), dia seguinte ao Soberania em Debate com Freixo, o Ministério da Saúde retirou do seu site oficial os dados brutos e tratados referentes ao histórico da pandemia de Covid-19 e alterou as formas de contagem para diminuir a totalização de mortos, manobra posteriormente barrada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O negacionismo, afirma o deputado, é um “projeto de destruição da sociedade das instituições, da democracia”.
Frentes e luta pedagógica
Na avaliação de Freixo, embora Bolsonaro tenha perdido aprovação nas redes e junto aos seus eleitores nos últimos meses, ainda mantém um núcleo de cerca de 30% de apoiadores e conta agora com o Centrão. O bloco conservador, destaca o deputado do Psol, foi se abrigar no governo para se proteger das investigações da Lava Jato. “Pela primeira vez, ele [Bolsonaro] perde muito espaço nas redes sociais, perde juventude, perde densidade. Mas, nesse momento, ganha deputados e conta hoje 200 parlamentares.”
O grande objetivo dos setores progressistas deve ser reduzir essa faixa de 30% a 10% ou 8%, estima Freixo. “A luta política tem que ser pedagógica. O governo tem toda a característica fascista. Mas a gente tem que fazer com o que o povo entenda, dialogar melhor com a população.” Na sua avaliação, em vez de questionar a vitória de Bolsonaro nas urnas, o mais eficaz para fragilizar o governo será apontar os crimes cometidos no exercício do poder. “Ele ganhou a eleição e jurou cumprir uma Constituição, que promove a separação dos três Poderes. Mas quando o Bolsonaro vai a um ato e fala no fechamento de dois Poderes, está rasgando a Constituição. Falou em fechar o STF: está cometendo crime. Precisamos dizer isso, que o Bolsonaro está desrespeitando a Constituição, quer fechar o Congresso, o Supremo, fala em intervenção militar. E não pode, porque não foi eleito para isso. É o que precisamos dizer.”
Além de um discurso que faça a relevância desses crimes alcançar as bases populares, Freixo defende a frente ampla pela democracia. “Temos que repetir o movimento das Diretas Já. Isso não é unidade no campo eleitoral, é unidade no campo democrático, porque a democracia está ameaçada.” Ao mesmo tempo, ele ressalta a necessidade de construir um projeto nacional para apresentar aos eleitores no cenário pós-pandemia. “A sociedade que vai sair pós-pandemia, não há como como ser a sociedade do Paulo Guedes [ministro da Economia]. Não há pós-guerra com Estado mínimo, e estaremos num pós-guerra. Esse projeto [do ultraliberalismo bolsonarista] vai entrar em parafuso. O que a gente vai propor?”, questiona Freixo.
O parlamentar distingue, então, uma frente ampla, de outra, eleitoral, alinhada a um projeto progressista, de avanços sociais. “São dois momentos. Tem uma pauta democrática, de enfrentamento ao fascismo, ao retrocesso, em que você precisa agrupar, inclusive, com o campo conservador – não reacionário. E aí é uma pauta mínima, da democracia, garantia das instituições, não fechamento do Congresso, enfrentamento à pauta do Bolsonaro. Essa, tem que ser ampla. E nessa, pode ter gente ali que ainda acha que depois da pandemia vai poder ter Estado mínimo e aí não vai ter acordo. Mas o debate de disputa eleitoral, de programa, não tenho a menor dúvida, esse precisa reunir o campo progressista, onde você vai ter que falar do SUS, da escola pública e gratuita como instrumento de combate à desigualdade, retomar o debate da escola em tempo integral, falar de renda básica permanente e não emergencial, porque vai ter uma crise econômica proporcional. A calamidade será estrutural, vamos precisar ter uma política estrutural. E não vai poder ser de R$ 200,00 (valor do auxílio que o governo queria aprovar).”
Neste segundo momento, o combate à desigualdade e o resgate da Constituição de 1988 devem estar no centro da proposta da esquerda, defende Freixo. “São dois pontos centrais para o campo progressista se debruçar e construir um programa”, diz. Nesse sentido, a questão da desigualdade deve ser enfrentada com um programa que vai da questão ambiental até a segurança pública, incluindo saúde, educação, meio ambiente. Uma retomada de direitos amparada no texto constitucional. “Não tem jeito, temos que resgatar a Constituição de 88, ela tem que ser um marco de realidade e de reconstrução de uma sociedade de direitos.”
> O Soberania em Debate é uma realização do Movimento SOS Brasil Soberano, iniciativa do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge RJ), que tem o objetivo de recolher subsídios para a construção colaborativa de um projeto de desenvolvimento nacional com empregos, soberania e justiça social