O documentário “Dedo na Ferida”, que tem como fio condutor a viagem de trabalho de um podólogo, de Japeri a Copacabana, e depoimentos de economistas e intelectuais, denuncia o avanço do poder do capital financeiro e transnacional, capturando direitos sociais e projetos democráticos em escala global. O filme foi selecionado para a mostra competitiva do Festival do Rio e será exibido no dia 12, às 13h, no Cine Odeon Net Claro, onde haverá também um debate com Silvio Tendler e a economista Laura Carvalho, e no dia 13, às 19h, no Kinoplex São Luiz 1. Foi produzido numa parceria com o Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge-RJ) e a Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros (Fisenge).
As análises da conjuntura econômica global foram colhidas de personalidades como YanisVaroufakis, ex-ministro das Finanças da Grécia; Celso Amorim, ex-ministro das Relações Exteriores do Brasil; Paulo Nogueira Batista Jr, vice-presidente dos banco dos Brics; o cineasta Costa-Gavras; os intelectuais Boaventura de Sousa Santos (Universidade de Coimbra, Portugal), David Harvey (Universityof New York, Estados Unidos) e Maria José Fariñas Dulce (Universidade Carlos III, Espanha); os economistas Ladislau Dowbor (PUC-São Paulo), Guilherme Mello (Unicamp) e Laura Carvalho (USP), entre outros pensadores que interferem no mundo contemporâneo.
Links para comprar os ingressos
O novo documentário de Silvio Tendler, reconhecido por mais de 80 obras de cunho histórico e social, aborda a influência do capital na política: – É uma crítica à política dominada pelo sistema financeiro. Você não discute mais o dinheiro a serviço da produção”, diz Tendler, lembrando que se trata de um fenômeno mundial. “Acho que é a primeira vez que vamos discutir com profundidade a força do sistema financeiro na economia. Para traçar um paralelo entre essas análises e o cotidiano dos afetados pelo poderio econômico, Silvio usa como fio de ligação a viagem de trabalho de um podólogo que mora em Japeri – cidade que tem o pior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Estado do Rio de Janeiro – até Copacabana, onde exerce sua profissão.
“O tempo de deslocamento dele todo dia é o tempo de uma sessão de cinema”, explica o diretor. “É o tempo que ele não vai ao cinema. Enquanto vai de Japeri à Copacabana poderia estar assistindo ao filme. ‘Dedo na Ferida’ discute uma sociedade na qual ele é um cidadão à margem, ele não tem uma conta no banco, ele não vai ao cinema, nem ao teatro. Não tem uma vida ativa. É um cara que trabalha para sustentar a família. Acredito que uma das reflexões para quem assiste ao documentário é as pessoas perceberem que está na hora delas terem uma vida interessante também.”
65 famílias detêm a renda de metade da população mundial
O filme também é uma aula de economia que deixa claro que, para 1% da população mundial, que detém o poderio econômico, uma crise não deve ser desperdiçada. É este pequeno grupo que, em nome dos interesses do grande capital internacional, comanda o destino dos recursos do planeta. Quebras de bolsas de valores, estouro de bolhas especulativas e a bancarrota de países que levam famílias para linha da miséria são oportunidades para aumentar o capital, o poder e a influência deste grupo. Eles são os donos do poder. 65 famílias têm, aproximadamente, a mesma riqueza que metade da população mundial. Bancos, seguradoras, fundos de investimento e elites econômicas navegam em uma esfera onde taxas de juros e dívidas de governos são a moeda mais forte.
“Dedo na Ferida” discute o retrocesso ideológico a posições neoconservadoras pautado pelo empobrecimento da classe média, pela falência dos Estados e pelo desemprego. Examina de que forma o capitalismo deixou de ser produtivo para se tornar meramente especulativo, motivado pela aposta na geração de dinheiro fácil.
O sistema financeiro, que deveria servir ao propósito de levar recursos dos setores superavitários para os deficitários interessados em investir em produção, abandonou o papel de “atravessador” e se assumiu como fim principal das transações econômicas. Os governos nacionais perdem autonomia e passam a lutar contra massas de capital que circulam livremente pelo globo. Grécia, Espanha, Portugal, Brasil e tantas outras nações veem seus destinos definidos pelos interesses da esfera financeira. Grandes corporações, que, por vezes, detêm orçamentos mais robustos do que o de alguns Estados, atuam como um “governo sombra”, guiando políticas públicas que favorecem à maximização de seus lucros.
Consideradas importantes demais para falir, grandes corporações envolvidas diretamente na crise que atingiu o sistema econômico internacional em 2008 não foram responsabilizadas pelo estrago causado na economia produtiva. Operando dentro da lei e socorridas com dinheiro público, seguem acumulando um capital volátil, transnacional, pouco produtivo e guardado em paraísos fiscais. E elas estão prontas para lucrar na próxima crise.
Parceria com o movimento sindical
Ampliar o debate com a sociedade brasileira sobre os crimes cometidos pelo sistema financeiro internacional em sua trajetória de semear a miséria em todos os continentes foi um dos principais motivos para que nascesse mais uma parceria do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge-RJ) e da Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros (Fisenge) com Silvio Tendler. Juntos, em 2014, produziram o documentário “Privatizações – A Distopia do Capital”. Em 2017 assinam o “Dedo na Ferida”.
“Quando pensamos no filme “Dedo na ferida”, o que nos moveu foi a necessidade de promover o debate no Brasil sobre um tema tão árido e tão distante da população. A captura dos governos nacionais pelo capital financeiro internacional é algo concreto, é algo evidente, mas que poucas pessoas enxergam. Queremos discutir isso com a população”, afirma Clovis Nascimento, presidente da Fisenge.
“É urgente popularizar, levar as informações da situação que o Estado brasileiro vive para a maioria das pessoas. O cinema, sua narrativa didática, permite isso. A proposta é que a exibição do “Dedo na Ferida” abra portas para debates em amplos segmentos sociais, para que seja apropriado por todos. As pessoas têm que ter consciência do que está ocorrendo para que, a partir da consciência, tenham capacidade de se indignar, de se mobilizar, de se rebelar e, talvez, fazer ecoar o grito de ‘BASTA’ nisso tudo que vivem hoje”, defende Olímpio Alves dos Santos, presidente do Senge-RJ.
Sinopse:
“Dedo na Ferida” trata do fim do estado de bem‐estar social e da interrupção dos sonhos de uma vida melhor para todos em um cenário onde a lógica homicida do capital financeiro inviabiliza qualquer alternativa de justiça social. Milhões de pessoas peregrinam em busca de melhores condições de vida enquanto o capital só aspira a concentração da riqueza em poucas mãos. Neste cenário de tensões sociais, intelectuais lutam para transformar o mundo levantando temas como o fim dos direitos sociais, o desemprego, o mercado e o ressurgimento de movimentos extremistas.
Biografia:
Em 48 anos de carreira, Silvio Tendler produziu e dirigiu cerca de 80 obras de cunho histórico e social entre curtas, médias e longas-metragens e séries. Licenciado em História pela Université de Paris VII é mestre em Cinema e História pela École des Hautes Études/Sorbonne. Desde 1979 é professor do Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio. Tem mais de sessenta prêmios, entre eles seis Margaridas de Prata, da CNBB.
Filmografia:
Silvio Tendler fez as três maiores bilheterias do documentário brasileiro. “Jango” recebeu o Margarida de Prata e o melhor filme do Júri Popular do Festival de Gramado. “Glauber–O filme, labirinto do Brasil” foi eleito melhor filme pelo júri popular e a crítica do Festival de Brasília e participou da Seleção Oficial Hors Concours do Festival de Cannes. “Encontro com Milton Santos” venceu o Festival de Brasília e levou o prêmio, em Cuba, de melhor filme no Festival de Documentários Santiago Álvarez.