Temer confirma fim da Reserva Nacional do Cobre e abre a Amazônia ao capital internacional

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O presidente Michel Temer extinguiu hoje (23) a Reserva Nacional do Cobre e Associados (Renca), criada em 1984, que definiu a proteção para o Estado de uma área de 47 mil quilômetros quadrados (km2), entre os estados do Pará e do Amapá. Mais do que cobre, estudos geológicos apontam similaridades com Carajás, indicando grande potencial para ocorrência de ouro, além de manganês, ferro e outros minérios na área. O decreto extinguindo a reserva já foi publicado no Diário Oficial da União.

Atualmente, a reserva inclui sete unidades de conservação, sendo três de proteção integral (Estação Ecológica do Jari, Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque e Reserva Biológica de Maicuru); quatro de uso sustentável (Reserva Extrativista Rio Cajari, Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Rio Iratapuru, Floresta Estadual do Amapá e Floresta Estadual do Paru) e duas terras indígenas (Rio Paru d’Este e Waiãpi). Além de povos indígenas e quilombolas.

“Esse decreto de abertura para garimpagem e desmatamento na Amazônia contraria uma das últimas medidas de defesa do país feita pelo governo militar: a criação da Reserva Nacional de Cobre”, diz o engenheiro Darc Costa, estudioso de questões relacionadas ao desenvolvimento e que ocupou a vice-presidência do BNDES na gestão de Carlos Lessa.

“Uma das últimas medidas ‘nacionais’ do regime civil-militar de 1964 foi jogada no lixo por uma canetada do [presidente Michel] Temer, ameaçando o futuro do país e abrindo a Amazônia”, afirma o historiador Francisco Teixeira, do CPDA-UFRRJ. “Ao mesmo tempo que são feitos cortes orçamentários no Comando da Amazônia, o governo abre a região aos interesses estrangeiros.”

Para o geólogo e ex-presidente do Serviço Geológico do Brasil (CPRM), Manoel Barreto, esses títulos não deveriam ser “postos em disponibilidade”, mas licitados, com condições próprias, compromissos associados a conteúdo nacional, valores e contrapartidas relevantes pré-estabelecidas. O modelo proposto por meio da portaria  nº 128/2017 do Ministério das Minas e Energia (MME), publicada em 7 de abril antecipando o fim da reserva, não assegura ganhos para o país compatíveis com o potencial econômico e estratégico da região. (Leia aqui a matéria completa.)

No caso das terras indígenas, a exploração de recursos depende de aprovação do Congresso Nacional, que, por lei, deverá ouvir as comunidades tradicionais do local afetado. Já o Sistema Nacional de Unidades de Conservação restringe qualquer atividade de mineração em unidades classificadas como de proteção integral e condiciona a realização de atividades desse tipo em unidades de uso sustentável a um plano de manejo. Das áreas existentes na reserva, apenas no caso de parte da Floresta Estadual do Paru há previsão de lavra de recursos minerais.

Questionado sobre os possíveis conflitos, o diretor-geral do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), Victor Hugo Froner Bicca, afirmou à Agência Brasil que há casos em que é preciso avaliar "o interesse nacional, o interesse público preponderante”. Caso não prepondere a perspectiva da conservação, ele aponta saídas que podem ser buscadas, como a oferta de compensações em outras áreas. “É preciso estabelecer esse contraditório em alto nível, para que se alcance o interesse maior da União.”

Órgãos voltados para a proteção ambiental, como o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (bama) poderão ser chamados para tratar sobre o tema.

O interesse do governo em extinguir a área havia sido exposto oficialmente em março deste ano, por meio da Portaria N° 128 do Ministério de Minas e Energia. Na justificativa da proposta, o ministério considerou “a importância de se criarem mecanismos para viabilizar a atração de novos investimentos para o setor mineral”, por entender que "a quebra da proteção viabilizará o acesso ao potencial mineral existente na Região e estimulará o desenvolvimento econômico dos Estados envolvidos”. O instrumento definiu que serão indeferidos os requerimentos minerários (autorizações de pesquisa, concessões de lavra, permissões de lavra garimpeira ou registros de licença) feitos durante a vigência do decreto que protegeu a área.

Por outro lado, os que estão pendentes de decisão e foram protocolados antes da criação da reserva serão analisados. “Vamos exigir dos requerentes uma atualização dos planos de pesquisa, comprovação de que estão em condições de executar aquilo que estão se propondo”, informou Victor Bicca. Ele acrescentou que novos requerimentos poderão ser apresentados para determinados trechos.

Segundo estudo técnico da organização WWF Brasil, 160 requerimentos estão nessa situação e, portanto, deverão ser verificados. Não obstante, a WWF antecipa que 142 requerimentos apresentam o termo “processo situado em área bloqueada”. Essa situação e a legislação ambiental brasileira fazem com que menos de 30% da reserva esteja acessível à exploração dos recursos minerais. “As regiões que apresentam contexto geológico favorável à mineração estão inseridas em áreas protegidas que bloqueiam a extração de recursos minerais”, diz o estudo, que antecipa “o risco de um potencial conflito entre os interesses do setor mineral e a conservação das áreas protegidas com interferência na Renca”.

*Com informações de Helena Martins – Repórter da Agência Brasil

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