Novo aumento da gasolina reflete política da Petrobras de estímulo à dependência externa

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A gasolina está 3,3% mais cara a partir de hoje (5) nas refinarias da Petrobras, acumulando uma alta de cerca de 10% em menos de uma semana em setembro. O reajuste é um dos efeitos da nova política da empresa, de alinhar os preços ao mercado internacional: reflete agora os impactos do furacão Harvey, que atingiu refinarias nos Estados Unidos, como pode, futuramente, resultar da crise entre EUA e Coreia do Norte, ou de qualquer outro incidente fora do país. Além de acompanhar os valores de referência globais, a empresa tem atualmente uma estratégia de “reduzir o volume de produtos refinados no Brasil e estimular as importações”, explica Cloviomar Cararine, técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), que atua na subseção da Federação Única dos Petroleiros (FUP).

“Até antes do golpe [que levou Temer ao poder, em agosto de 2016], a Petrobras não acompanhava o preço do barril internacional; tinha uma política mais estável de preço”, explica. “Agora, o valor do barril não tem mais a ver com a produção de petróleo no país nem com o custo do refino, mas com a cotação internacional.” E o Brasil, diz ele, vem reduzindo gradativamente sua participação neste mercado.

Dos 3 milhões de barris/dia de petróleo, em média, que o Brasil produz, a Petrobras refinou, em agosto, 1,7 milhões, ou cerca de 70% da capacidade disponível nas suas refinarias, da ordem de 2,4 milhões de barris/dia. “Passamos a depender cada vez mais de importações, que aumentaram muito desde janeiro”, diz o técnico do Dieese. Em um ano, de julho de 2016 a junho de 2017, o consumo de gasolina subiu 9,6%; mas a sua importação cresceu 125%. Um dos argumentos para comprar menos internamente é o de que, no momento, os preços da gasolina, do diesel e do GLP (gás de cozinha) estão mais baixos fora do país – uma abordagem, avalia Cararine, de curto prazo e de negócio, sem valor estratégico para uma política energética nacional.

A partir de 2016, também se verifica uma onda de autorizações do órgão regulador aos interessados em importar derivados: 116 novas empresas foram cadastradas na Agência Nacional de Petróleo (ANP) desde o ano passado, ou praticamente um terço (30,5%) do total de 380 cadastros feitos desde 1997. São grandes distribuidoras e produtoras de petróleo e também consumidoras intensivas, como empresas de transporte ou locadoras de automóveis.

A Petrona, por exemplo, gigante petroleira da Malásia instalada no Brasil, entrou com força no negócio de importação de derivados. Em agosto, respondeu por 9% do total importado. “Significa que a Petrobras está realmente perdendo mercado”, critica Cararine, que observa, ainda, a inclinação da estatal a, paralelamente, aumentar suas exportações de petróleo – da ordem de 700 mil barris/dia. “Estamos produzindo petróleo, refinando uma parte – cada vez menor –, exportando outra, e deixando as empresas entrarem para vender o derivado aqui.”.

Segundo o técnico do Dieese, a Petrobras manteve no seu Plano de Negócios para 2017 a 2021 o investimento em refinarias, mas bem em valores menores. A ênfase está na produção e exploração, não no refino. “E o presidente da empresa, Pedro Parente, vem todo o tempo ressaltando a importância de fazer parcerias nessa área. Estamos acompanhando e percebendo que há um desinteresse da Petrobras em ser a única que refina, assumindo publicamente a intenção de atrair capital privado para a atividade.” Diretriz que está explícita no documento divulgado em maio pelo Conselho Nacional de Politica Energética, coordenado pelo Ministério das Minas e Energia: a política do governo passa a ser de criar ambiente para que empresas estrangeiras possam entrar no setor de refino.

A construção desse ambiente propício, de acordo com Cararine, envolve alguns aspectos chaves. O primeiro é a paridade internacional dos preços do derivado, independentemente da capacidade produtiva do país ou dos seus impactos para o conjunto da economia. A outra é assegurar a estrutura logística para que, em caso de venda ou associação com o capital privado, a cadeia produtiva esteja disponível. “É provável que, se anunciar a venda de uma refinaria, o governo inclua na operação também a Transpetro, para garantir a distribuição, e a termoelétrica próxima que mantém suas atividades, de modo a garantir que não falte produto.”

Enquanto isso, as refinarias vão reduzindo o ritmo (veja o quadro). A Refinaria Henrique Lage (Revap), localizada em São José dos Campos, no Vale do Paraíba, por exemplo, trabalha com apenas 60% da sua capacidade. Um PDV (plano de demissão voluntária) da Petrobras, em 2016, obteve 12 mil inscritos, o dobro do registrado em 2014, quando o plano visava, então, apenas beneficiar os empregados em idade de se aposentar. Cararine conta também que a empresa adotou uma nova metodologia para quantificiar o efetivo necessário nas plantas, que tem, na prática, reduzido o pessoal envolvido na atividade de refino.

Acabou a política do “poço ao poste”, que dava ao país capacidade e tecnologia para controlar desde a exploração e produção do petróleo até o fornecimento dos derivados nos postos e o abastecimento das usinas termoelétricas de geração de eletricidade. Na bomba, segundo dados da ANP, o preço médio da gasolina para o consumidor chegou ao seu ponto mais alto na semana passada – de R$ 3,778 por litro.

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