Despejo de 450 famílias em Minas poderá ser novo Massacre de Eldorado do Carajás, alerta Stédile


Produção do Acampamento Quilombo Campo Grande – Foto: MST

O despejo das 450 famílias do Acampamento Quilombo Campo Grande, que há mais de 20 anos moram no terreno da usina falida Ariadnópolis, em Campo do Meio, no Sul do Minas, pode se transformar em um novo Massacre de Eldorado do Carajás, alerta João Pedro Stédile, dirigente do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). A retirada dos trabalhadores de suas casas foi determinada no último dia 7 de novembro por um juiz da Vara Agrária, em Belo Horizonte, e marcada para esta terça-feira (13).

“Todos vocês devem estar lembrados do que aconteceu em Carajás em 1996; pois bem, uma nova tragédia está anunciada”, afirmou Stedile, referindo-se à morte de 19 pessoas em 17 de abril de 1996, numa ação da Polícia Militar do Pará para retirar da estrada manifestantes sem terra, na cidade de Eldorado do Carajás. A perícia dos corpos revelou que pelo menos 10 trabalhadores foram executados à queima-roupa, e sete lavradores por instrumentos cortantes, como foices e facões.

O Acampamento Quilombo Campo Grande, nas terras que foram da usina de cana de açúcar falida, já tem rede elétrica, escola pública, centenas de moradias construídas, 520 hectares de plantação de café, 1,2 mil ha de milho, feijão, mandioca e abóbra, 40 ha de horta agroecológica, um resultado de décadas de trabalho. Entre 2017 e 2018, foram produzidas mais de 8,5 mil sacas de café, 55 mil sacas de milho e 500 toneladas de feijão, segundo reportagem do jornal Brasil de Fato. As famílias têm ainda galinhas, porcos, cabeças de gado, fornecendo produtos para o comércio da região. A área total, com 3,6 mil hectares, emprega cerca de 1,3 mil pessoas – ou cerca de três trabalhadores para cada dez ha.

A usina Ariadnópolis, da Cia. Agropecuária Irmãos Azevedo, faliu em 2002, deixando, segundo Stédile, mais de R$ 300 milhões em dívidas, inclusive trabalhistas. Muitos dos moradores do acampamento são ex-empregados da companhia, que não receberam seus direitos. O governo do Estado de Minas Gerais, de acordo com o dirigente do MST, fez um acordo com a massa falida da usina para pagar R$ 90 milhões, referentes ao valor estimado do terreno utilizado pelas famílias. Manobras judiciais, contudo, têm deixado se arrastar há anos o processo de assentamento definitivo.

Lideranças do Acampamento Quilombo Campo Grande procuraram a Organização dos Estados Americanos (OEA) para denunciar a arbitrariedade da decisão judicial, contrária a princípios constitucionais ao não reconhecer valores de dignidade humana. E estão buscando apoio em entidades de defesa dos Direitos Humanos. O MST continua tentando na Justiça garantir a existência da comunidade e um abaixo-assinado de comerciantes da região pede que as famílias permaneçam produzindo no local. A sua desapropriação diz Stédile, “poderá ser um tragédia.”

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